
Na primeira entrevista após completar o período de quarentena, o ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto afirma que qualquer decisão sobre as contas públicas no país atualmente cai na polarização política entre ricos e pobres.
“O discurso de ‘nós contra eles’ é ruim para todo mundo. Não é o que vai fazer o país crescer de forma estrutural. Precisamos unir todo mundo, o empresário, o empregado, o governo”, disse à Folha um dia antes de assumir o cargo de vice-chairman e chefe global de políticas públicas do Nubank, em 1º de julho.
Campos Neto reagiu a críticas do ministro Fernando Haddad (Fazenda) de que teria deixado uma herança de alta de juros para o sucessor no BC, Gabriel Galípolo. “É triste quando a narrativa é mais importante do que a busca de uma solução estrutural.”
Ele nega que vá contribuir para uma eventual candidatura presidencial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Mesmo fugindo das especulações, Campos Neto diz que enxerga um movimento à direita na América Latina. “As ideologias de esquerda têm uma obsessão com igualdade e não com a diminuição da pobreza.”
O sr. defende o fim da isenção?
Se for aumento da carga tributária, o Brasil não suporta mais. É preciso entender que, em vez de sempre adotar um discurso de que as empresas têm que pagar mais, precisamos ter uma base tributária que seja boa o suficiente para estimular o investimento privado, porque público a gente não tem. Às vezes, vejo um empresário que faz uma crítica ao Bolsa Família, aí ele apanha…
O sr. está falando do “rei do ovo”, o empresário Ricardo Faria, que disse que há viciados no Bolsa Família? Não quero falar de pessoas. Vários empresários falam a mesma coisa, que tem vários estados no Brasil que têm mais gente que ganha Bolsa Família do que trabalhador de carteira assinada. Ninguém está estimulando que não tenha o programa. A grande pergunta [é]: será que o Bolsa Família está gerando informalidade? Existem evidências. O discurso de “nós contra eles” é ruim para todo mundo. Não é o que vai fazer o país crescer de forma estrutural. Precisamos unir todo mundo, o empresário, o empregado, o governo.