A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou ontem, por três votos a dois, a cassação do deputado estadual Fernando Francischini (União Brasil-PR), aliado do presidente Jair Bolsonaro. A decisão colegiada derrubou liminar em favor do parlamentar, concedida por Kassio Nunes Marques. Logo depois do julgamento, Bolsonaro disse, aos gritos, que “tem de haver uma reação”, insultou ministros e ameaçou não cumprir ordens da Corte.
O resultado da sessão representa novo revés ao governo no Supremo, pois reforça o posicionamento já manifestado pela Justiça Eleitoral de que não serão tolerados ataques às urnas eletrônicas. Nunes Marques defendeu o devolução do mandato de Francischini e foi seguido por André Mendonça.
Votaram pela cassação Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
O deputado perdera o mandato no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em outubro passado por divulgar notícias falsas em transmissão ao vivo em uma rede social no dia da votação de 2018. Na ocasião, ele disse que, ao tentar digitar na urna o número 17, de Bolsonaro, apareceu o 13, do PT.
O placar dissipou, por ora, o clima de crise que começara a se armar na Corte pelo fato de um único ministro ter suspendido os votos de seis dos sete juízes do TSE – três deles integrantes do Supremo. O resultado, ainda, evidencia o isolamento dos dois magistrados indicados por Bolsonaro.
Relator e presidente da Turma, Nunes Marques afirmou que o TSE inovou ao equiparar redes sociais a meios de comunicação, descritos na Lei de Inelegibilidade. “Não é possível afirmar que essas eram as balizas por ocasião do pleito ocorrido em 2018. Ninguém poderia prever, naquela eleição, que tais condutas seriam vedadas na internet, porque não havia qualquer norma ou julgado a respeito”, defendeu.
Já segundo Mendonça, a devolução do mandato “preserva a vontade democrática” dos eleitores – foram 427 mil votos em Francischini. “Um ato praticado a 22 minutos do encerramento do pleito eleitoral não teve o condão de alterar a lisura do pleito”, afirmou. O bolsonarista foi o deputado estadual mais votado no Paraná.
ATROPELO
Atual presidente do TSE, Fachin apresentou um duro voto. Ele disse que Nunes Marques atropelou uma “decisão tomada por ampla maioria do Tribunal Superior Eleitoral”. “Há que se ter redobrada cautela com os argumentos que, a pretexto de afirmar a força normativa de suas normas, realizam práticas desconstituintes, enfraquecendo a democracia e erodindo as regras do regime republicano, o qual se sabe é um regime de liberdade com responsabilidade.”
Fachin ainda afirmou que o STF não pode ser “omisso” diante de ataques à democracia. Na sequência, Lewandowski seguiu a divergência aberta pelo colega, e voto de Gilmar foi decisivo.
O decano da Corte desempatou o placar ao defender que o ataque de Francischini ao sistema eleitoral não pode ser “enquadrado como tolerável em um estado democrático de direito”. Gilmar, ainda, defendeu que o uso indevido das redes sociais está “incluído no conjunto de atos abusivos que autorizam a cassação”.
O processo foi colocado na pauta da Segunda Turma por Nunes Marques, que preside o colegiado, horas antes do início de um julgamento no plenário virtual do Supremo, onde a decisão tinha chance ainda maior de ser cassada. A análise, que teria a participação dos 11 membros, foi interrompida a pedido de Mendonça minutos após a abertura da sessão e antes de haver maioria de votos. Os ministros analisaram um pedido de Pedro Paulo Bazana (PSD-PR), que assumiu a cadeira deixada por Francischini na Assembleia Legislativa do Paraná.
FÚRIA
Após a sessão, Bolsonaro ficou irritado. Na cerimônia intitulada Brasil pela Vida e pela Família, realizada no Palácio do Planalto, o presidente disse estar indignado e afirmou que não viverá “como um rato”, uma vez que já repetira diversas vezes as mesmas declarações de Francischini.
“Não existe tipificação penal para fake news. Se tiver, que se feche a imprensa”, afirmou o presidente, em mais um ataque aos veículos de comunicação, no Dia Nacional da Liberdade de Imprensa.
Bolsonaro subiu ainda mais o tom contra os ministros Alexandre de Moraes, que vai comandar o TSE a partir de meados de agosto; Fachin, atual presidente da Corte; e Luís Roberto Barroso. “Eu não vou viver com um rato. Tem de haver uma reação”, disse, aos berros.
O presidente afirmou ser do tempo em que decisão da Justiça não era discutida, mas, sim, cumprida. “Eu fui desse tempo. Não sou mais”, disse. A declaração de Bolsonaro ocorreu após novas críticas feitas sobre o julgamento ainda em análise do novo marco temporal que pode ampliar a demarcação de terras indígenas. Segundo ele, Fachin comete “um estupro contra a democracia brasileira”.
Francischini, agora, perde o mandato e volta a ficar inelegível por oito anos. “Não vão nos calar!”, afirmou ele, em uma rede social. Há ainda pendente de julgamento um recurso extraordinário do deputado cassado, que vai julgar o mérito do caso.
Da redaçõ do Portlpe10 com informações do jornal O Estado de S. Paulo.