Um policial militar disparou o tiro que matou Heloysa Gabrielle, de 6 anos, na comunidade de Salinas, em Porto de Galinhas, em Ipojuca, no Grande Recife. A informação foi repassada, nesta sexta (29), pelo Gabinete de Apoio Jurídico às Organizações Populares (Gajop), que teve acesso ao inquérito. O documento foi concluído pela Polícia Civil e enviado ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
Ainda segundo a entidade de defesa dos direitos humanos, o documento aponta que há indícios de fraude processual praticada por policiais militares que participaram da ação, em 31 março deste ano.
O inquérito foi finalizado na terça-feira (26), pelo delegado Ícaro Schneider, mas nem a polícia nem o MPPE divulgaram informações oficialmente.
O g1 só obteve informações sobre o inquérito após procurar o Gajop, que acompanhou o caso de Heloysa Gabrielle desde o início.
A entidade repassou dados contidos no inquérito por meio de nota. Disse, ainda, que fez a divulgação depois de consultar a família da criança.
Segundo o inquérito obtido pelo Gajop, o policial que disparou o tiro em Heloysa Gabrielle foi indiciado por homicídio com dolo eventual. Nesse caso, ele assumiu o risco de matar, de acordo com a polícia.
A menina estava brincando no terraço da avó quando PMs do Batalhão Policial de Operações Especiais (Bope) entrou na comunidade. Moradores disseram, desde o início, que eles chegaram atirando. A Polícia Militar informou, inicialmente, que houve troca de tiros com criminosos.
Posteriormente, surgiu um vídeo que mostra um homem numa moto sendo perseguido por uma viatura do Bope. De acordo com a polícia, esse homem seria o suposto criminoso perseguido.
Ele foi morto em maio, junto com dois outros homens, dois meses após a morte de Heloysa, numa suposta troca de tiros com PMs do Bope, em Igarassu, no Grande Recife.
Os policiais são investigados por inquérito policial militar por fraude processual por terem afirmado que perseguiam um criminoso durante uma troca de tiros. A conduta dos agentes públicos, que não tiveram o nome divulgado, é apurada também em sindicância administrativa na Corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS).
Detalhes
Na nota, o Gajop, informou que foram considerados, para a conclusão do inquérito, depoimentos, reprodução simulada e uma perícia de microcomparação balística. Essa perícia apontou que a munição que atingiu Heloysa saiu da arma de um policial militar.
No texto do documento obtido pelo Gajop, o delegado pediu a decretação de medidas cautelares. Uma das solicitações é que o responsável pelo tiro seja afastado das funções, enquanto “restarem dúvidas em relação à sua participação, bem como não tenha contato direto com as testemunhas”.
O Gajop informou, também, que, de acordo com o inquérito, “ficou claro que a pessoa que estava sendo perseguida na ocasião pela polícia não efetuou disparos”.
Os advogados do Gajop e do Projeto Oxé, que prestam assistência jurídica à família, afirmaram, ainda, que consideram que o delegado deixou de considerar alguns pontos que consideram essenciais sobre o caso.
Um deles é o fato de o indiciamento não qualificar o crime com o agravante de ser praticado contra uma criança, o que aumentaria a pena em um terço.
“Importante ressaltar que continuaremos acompanhando as investigações na Corregedoria e no Inquérito Policial Militar para as devidas elucidações sobre os indícios de tentativa de forjar cenário da cena da morte da criança. Seguimos por Justiça para Heloysa”, finaliza a nota do Gajop.
O g1 entrou em contato com a Polícia Civil e com a Secretaria de Defesa Social para informar que tinha conseguido dados sobre o inquérito.
Em nota, a Polícia Civil informou apenas que “o inquérito, referente ao caso da menina Heloysa Gabrielle, foi concluído com indiciamento e remetido à Justiça. No âmbito administrativo, a Investigação Preliminar instaurada pela Corregedoria está em fase de conclusão, assim como o Inquérito Policial Militar instaurado pela PMPE”.
Até a publicação desta reportagem, a SDS ainda não havia pronunciado.
Falta de transparência em outros casos
A falta de transparência na divulgação de dados do inquérito que investigou a morte de uma menina em Porto de Galinhas, em Ipojuca, no Grande Recife, é mais um caso em que o governo de Pernambuco deixa lacunas ao tratar de violência policial.
Casos como o dos tiros de balas de borracha que provocaram a perda do globo ocular de duas pessoas, em um protesto pacífico no Recife, e de mortes de adolescentes nas periferias, ficaram sem respostas para a opinião pública.
*As informações são do G1.