O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania classificou a conduta da Câmara dos Deputados no episódio de transfobia protagonizado pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) como “passível de responsabilização criminal por transfobia e discurso de ódio”. O posicionamento do Executivo foi encaminhado à Câmara em nota técnica assinada pelo ministro Silvo de Almeida e por Symmy Larrat, secretária Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+.
Nikolas usou a tribuna no dia 8 de março para, em tom de deboche, afirmar que se “sentia mulher” tendo “lugar de fala” para discursar sobre a efeméride — Dia Internacional da Mulher.
“A não responsabilização configura uma ameaça à estabilidade democrática, que se apresenta em diversas partes do mundo, com especial incidência sobre o Brasil. A estratégia política baseada no ódio encontra terreno fértil seja pela conivência institucional com a violência, seja pelas lacunas relativas à transparência e ao uso de dados das empresas de plataformas digitais, que concedem alcance e repercussão a discursos que promovem extremismo e violações aos direitos humanos”, diz o documento.
Ainda segundo a pasta, o episódio demonstra o “amalgamento da discriminação nas representações políticas hoje eleitas” e expõe a falta de ação do Congresso para punir efetivamente o parlamentar pelo comportamento transfóbco. Por isso, o ministério recomenda que seja dada sequência às apurações contra o deputado federal na Câmara dos Deputados.
“A ausência de medidas efetivas por parte do Poder Legislativo contribui para a manutenção de um estado de violência contra a população LGBTQIA+, violência esta que, como observado no caso em quest ão, chega a ser propagada a partir da própria Câmara dos Deputados“, afirma o texto.
O Ministério lembra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que classificou a homotransofbia como crime equiparável ao crime de racismo e lembra que “o uso da transfobia recreativa, como apontado anteriormente, é uma forma de mascarar os processos violentos e fatais aos quais as pessoas trans, travestis e não-binárias estão expostas diariamente na sociedade brasileira”.
“O reconhecimento criminal da homotransfobia é o reconhecimento de que não se pode tolerar o intolerável. A ausência de dados, bem como o silêncio naturalizador das instituições, em termos de ações efetivas, são parte do problema a que a população LGBTQIA+ segue exposta”, aponta a manifestação.
Em 2019, o STF decidiu, por 8 votos a 3, que a homofobia e a transfobia devem ser enquadradas como racismo no Código Penal brasileiro, até que o Congresso Nacional aprove uma lei específica sobre o tema. A decisão foi tomada a partir de duas ações que questionavam a omissão do Congresso em aprovar uma legislação que criminalizasse a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero.
“O Estado brasileiro precisa, em todas as suas instâncias e competências, dispor de ações efetivas de garantia de proteção ao referido grupo social, inclusive no que diz respeito às atividades econômicas privadas, em especial no caso das plataformas de redes e mídias sociais”, conclui o ministério.
Na ocasião, Nikolas disse que se “sentia mulher, a deputada Nikole”. O caso ganhou projeção nacional e deputados da oposição pediram a cassação de Ferreira na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados. O ato também é tema de cinco ações que correm no Supremo.
*As informações são da Agência O Globo.