Um mapa que mostra os locais onde havia concentração de votos ao então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi usado, segundo a Polícia Federal, na reunião em que foi discutida uma operação para dificultar o deslocamento de eleitores no segundo turno. É o que mostra a investigação da PF que levou ao cumprimento de um mandado de prisão contra o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques e de dez mandados de busca e apreensão contra dirigentes da corporação.
O documento estava no celular da delegada federal Marília de Alencar, então diretora de Inteligência do Ministério da Justiça, sob a gestão de Anderson Torres. Em depoimento, ela afirmou que a área técnica da pasta foi demandada por Torres para levantar a quantidade de agentes de cada corporação que poderia ser usada no dia da votação.
“É relevante observar que, conforme o tópico anterior deste relatório, havia uma reunião agendada com o ministro para 11h. Sendo assim, como esta imagem foi capturada às 11h23, há fortes indícios de que esta fotografia tenha sido realizada para esta reunião”, explica a PF na representação pelos mandados feita ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
No arquivo periciado, há uma foto de uma folha de papel com a impressão de um painel com o título “Concentração maior ou igual a 75% – Lula”. Na página, também aparece um mapa do Brasil e uma lista de cidades, como Crato, no Ceará, e Paulo Afonso, na Bahia. Nesses dois locais, por exemplo, Lula tinha 63% e 48% dos votos, enquanto Jair Bolsonaro (PL) tinha 13% e 18%, respectivamente.
“Na coluna “BOLSONARO”, há indicativo de um total de 1.485.294 votos, seguida pela coluna “LULA” com número total de 7.743.713. As colunas de percentuais apontam 15,37% na coluna “% BOLSONARO” e 80,15% na coluna “% LULA”. Há também uma coluna final de partidos”, ressalta a PF.
De acordo com as investigações, esse planejamento foi encaminhado ao então superintendente da PF na Bahia, Leandro Almada. Às vésperas do segundo turno, Torres viajou à Bahia para uma reunião com Almada na qual pediu que a corporação trabalhasse junto com a PRF nas operações de 30 de outubro.
Naquele dia, segundo dados do Ministério da Justiça, a corporação parou 324 ônibus em estradas do Nordeste, onde Lula obteve seus maiores índices de votação, enquanto no Centro-oeste foram 152; no Sudeste, 79; no Norte, 76; e no Sul, 65. Segundo o atual diretor-geral da PRF, Antônio Fernando Oliveira, a atuação da polícia na ocasião foi “desproporcional” no Nordeste, com mobilização superior à empregada durante as festividades de São João, maior operação da corporação na região.
A PF apurou ainda que, às 15h26min do dia 18 de outubro, foi elaborado ou modificado um arquivo Excel encontrado na área “Documentos” do telefone de Marília com o nome “BA_ELEICOES_.xlsx”. Esse arquivo traz as colunas “QTD EQUIPES”, “BASE”, “TOTAL DE ELEITORES” e “ALCANCE NO ESTADO”, que indicariam, segundo os investigadores, o possível alcance de eleitores pelas equipes da PRF, abrangidos pelas suas bases/pontos fixos.
Diferença no número de ônibus fiscalizados
Na representação que embasou a determinação o deferimento dos mandados, a Polícia Federal chama de “autoexplicativa” a diferença no número de ônibus retidos e fiscalizados na região Nordeste para as demais regiões do país durante o segundo turno das eleições de 2022.
“Ao se analisar os dados de fiscalização e retenção de ônibus no dia da votação do Segundo Turno das Eleições de 2022, 30/10/2022, as diferenças chamam ainda mais a atenção, sendo que os números são autoexplicativos”, aponta a PF.
A PF usou dois gráficos para mostrar a que se referia ao utilizar a palavra “autoexplicativo”. Em um deles, o total de ônibus fiscalizados no dia do segundo turno das eleições na região Nordeste aparece como 324, seguindo por 152 na região Centro-Oeste, 79 na região Sudeste, 76 na região Norte e 65 na região Sul.
O total de ônibus retidos no dia 30 de outubro de 2022 também é mostrado pela PF em um gráfico onde se vê nove veículos na região Nordeste contra dois na região Norte, um na região Centro-Oeste, um na região Sudeste e nenhum na região Sul.
Ainda de acordo com a argumentação da PF ao Supremo, além dos números de ônibus retidos ou fiscalizados, também chamou a atenção dos investigadores um ofício emitido pelo Diretor-Geral da PRF no qual consta que “houve inicialmente a emissão de um único Plano de Trabalho, datado em 27 de setembro de 2022 que englobaria as operações do 1o e 2o turnos, caso houvesse”.