O “jogo do tigrinho” tomou a internet e pagou por isso. O caça-níqueis adaptado para tela de celular, oficialmente chamado de Fortune Tiger, está se disseminando pelas redes sociais, apesar das limitações previstas por grandes empresas de tecnologia por trás do Instagram, WhatsApp, Facebook, X (ex-Twitter) e TikTok.
A face mais visível desse fenômeno está no Instagram. Nas últimas semanas, usuários têm reportado assédio de perfis falsos que fazem solicitações de amizade, marcações em publicações sobre o tigrinho e abordagens com promessas de bônus em dinheiro para aqueles que fizerem apostas através de suas investidas.
Mas essa é só a ponta do iceberg. Há evidências de que programas de afiliados, com método de funcionamento semelhante ao de esquemas de pirâmide, estejam por trás da produção em massa de spam. Neste negócio, a pessoa que publica o link para a casa de apostas recebe uma parte do dinheiro perdido pelos internautas convencidos a apostar.
Questionada sobre os possíveis furos na moderação, a Meta disse trabalhar “muito” para limitar a disseminação de spam no Facebook e no Instagram, porque não permite conteúdos que possam enganar os usuários.
“Procuramos impedir que as pessoas se utilizem de forma abusiva de nossas plataformas, produtos ou recursos para aumentar artificialmente a visualização ou distribuir conteúdo em massa para ganho comercial.”
Não há uma legislação específica que proíba a publicidade desse tipo de aposta.
O Fortune Tiger e outros jogos de “slots”, como são chamados os caça-níqueis eletrônicos, não estão legalizados no Brasil. São oferecidos no país a partir de uma brecha na legislação, que permite jogos eletrônicos apenas de quota fixa —quando o apostador sabe o quanto pode ganhar na aposta com base no risco de derrota.
Os caça-níqueis são jogos de chance, em que a pessoa não sabe o risco exato de perder antes de apostar. Os sites de apostas, porém, estão sediados em paraísos fiscais, como as ilhas de Malta e Curaçau, e não têm representação jurídica no Brasil, o que dificulta a responsabilização.
Pela promessa de fortuna rápida e garantida, o jogo caiu no gosto de muitos brasileiros. O interesse pelo tigrinho nas buscas, segundo a plataforma Google Trends, partiu de zero em abril de 2023 para alcançar o pico de cem pontos possíveis em dezembro do mesmo ano. Desde então, o interesse tem oscilado sempre acima dos 50 pontos.
São nos programas de afiliados que o jogo ganha terreno no país. No esquema, as casas de apostas pagam um valor fixo sobre as apostas feitas em um link, identificado a partir de um código individual para cada influenciador.
O apostador ainda é incentivado a convidar mais pessoas para o programa, uma vez que recebe uma parcela dos lucros de quem ele convenceu a entrar no esquema.
“O influenciador traz novos clientes e ganha em cima deles. Posteriormente, os novos clientes trazem outros e por aí vai, como um esquema de pirâmide mesmo”, resume Anselmo.
A situação se repete em outras redes sociais, fora do domínio da Meta, demonstrando o poder de penetração do esquema na internet afora.
O curitibano Fernando Cavalheiro, 24, diz receber propostas para fazer vídeos do tipo ao menos uma vez por dia. Com mais de 500 mil seguidores na rede e outros 35 mil no Instagram, ele relata que, para fazer seis publicações no mês, foram oferecidos R$ 25 mil e bônus de até R$ 50 para cada novo depositante. Caso o jogador perdesse dinheiro na plataforma, Fernando ainda ganharia 80% do valor apostado.
“É uma tentação para quem está começando nesse mundo da internet e vai do caráter de cada um. São valores muito acima da média, até dez vezes mais do que eu costumo cobrar, isso sendo um influenciador pequeno. Não dá nem para comparar com o que um influenciador grande recebe, que é coisa de centenas de milhares ou até milhões de reais”, afirma.